sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

DEMOCRACIA DIGITAL (III)

Contrariando de algum modo o espírito desta coluna de opinião, assim como as evidências resultantes da recente campanha eleitoral americana, a Princeton University Press publicou o livro “The Myth of Digital Democracy “ de Matthew Hindman.

O autor, professor universitário de ciência política, tenta equacionar (ou talvez mesmo destruir) a percepção colectiva de que a internet fomenta a participação cívica e aumenta o poder político dos cidadãos. Hindman chega, pois, a conclusões interessantes e contra-corrente: a internet mantém o poder de intervenção nas elites e não ampliou a “political voice” para audiências globais.

É, de facto, interessante analisar que a infra-estrutura em que assenta a internet não é igualitária, ou seja, nem todos têm o mesmo acesso à navegação. Depende tanto do grau de info-inclusão do utilizador como da velocidade no acesso. Daqui já resultam discrepâncias enormes.

Por outro lado, e mais relevante ainda, os motores de busca são ferramentas que aumentam as diferenças entre utilizadores e o fosso entre a informação disponível e a alcançada. Isto é, por razões tantas vezes comerciais os internautas são conduzidos para resultados pré-definidos.

Basta atentar no modo como funciona o motor de pesquisa com maior quota de mercado mundial…

Na verdade, ao procurarmos determinadas informações são-nos sugeridos resultados que, as mais das vezes, nem equacionamos tomando-os como válidos. A validade assenta em “campeões de clicks”… Em suma, a opinião global é moldada por critérios que não dominamos. A ausência de transparência afecta, neste particular, a força democrática da net.

Por outro lado, Hindman refere, ainda, que as mensagens afixadas em blogues com impacto político efectivo têm apenas audiências qualificadas e não de massas, pelo que o alcance transformador democrático pode ser duvidoso. Talvez…mas a verdade é que passou ainda pouco tempo para se passar do perfil internauta-consumidor ao internauta-produtor.

“Ciberapartheid” é um conceito que surge no livro para descrever uma dispersão de conteúdos na internet, que tenderia a prejudicar o sentido de “bem comum ou interesse geral” na web. Ora, em bom rigor, os exemplos de activismo cívico e de cooperação por causas comuns são imensos.

Apesar de tudo, é interessante perceber que há quem se dedique ao contraditório de uma tendência inelutável, porquanto esse alerta só serve para melhorar e aprofundar o uso das tecnologias da informação como ferramentas democráticas.
Publicado no OJE

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