O episódio do Provedor de Justiça ficará certamente na memória de todos como um dos mais desastrosos desta legislatura. O parlamento, uma vez mais, não soube cuidar da respectiva imagem e, por isso, as jogadas de bastidores e a politiquice de vistas curtas acaba por penalizar a sede democrática e a credibilidade do regime.
Pelo meio houve ainda tempo para o PSD matar um dos seus progenitores. Freud explicaria bem este comportamento de um PSD que não olha a meios para atingir fins. O vexame a que foi exposto o Prof. Jorge Miranda era absolutamente desnecessário e, mais ainda, totalmente injusto. Jorge Miranda conhece como poucos a Constituição e saberia assim interpretar o papel de Provedor com arte, prudência e acutilância. O PSD não quis…
Bom, resolvido que está o imbróglio, importa agora olhar para a frente e tentar perceber qual o papel que melhor se adapta a um provedor do futuro.
Hoje em dia, perante um quotidiano que nos oferece mais e mais inovações de ordem económica, social e cultural, valeria a pena meditar sobre os actuais poderes do Provedor e tentar compreender se estão adequados às exigências.
Talvez antes ainda buscar um sentido para a manutenção desta figura de provedoria que, tal como o nome indica, não tem poderes executivos senão os de ouvir e influenciar.
O “ombudsman”, que deu origem à figura jurídica que é o nosso provedor, foi criado num contexto histórico e espacial determinado, exactamente por isso vale a pena perceber se as circunstâncias actuais não imporiam uma reformatação das competências e dos perfis exigidos. Creio, sinceramente, que este teria sido o debate saudável e necessário muito mais do que em torno da pessoa A, B, C ou D.
Por exemplo, a sociedade da informação traz-nos novos desafios: um admirável novo mundo tecnológico que ajuda à construção de uma rede de conhecimento e de informação à escala global. Todavia, por arrasto surgem riscos e potenciais vulnerabilidades para os direitos individuais e colectivos. Ora, um provedor do futuro tem que conhecer e estar atento a esta nova realidade.
Outro exemplo, somos cada vez mais consumidores expostos a uma sociedade de imagem e de sedução, que tantas vezes nos “vende gato por lebre”, por isso mesmo a provedoria não poderá ser apenas uma espécie de balcão de reclamações sem efeito útil subsequente.
E muitos outros exemplos, nos domínios da saúde, da educação, da imigração, etc etc, poderiam ser dados. Ora, tudo depende da forma como quisermos observar esta figura: uma espécie de apêndice do poder executivo, apesar de eleito pelo parlamento; algo mais do que uma mera câmara de ressonância ou um incansável actor constitucional?..
O processo de escolha deveria ser também alterado permitindo uma participação mais acentuada dos cidadãos – ou pelo menos de associação e federações representativas – numa sinergia com o papel do parlamento.
Um coisa é certa: se apenas voltarmos a falar do Provedor no termo do seu mandato é por que algo correu mal: ficou tudo na mesma e não há nada pior!
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