terça-feira, 6 de abril de 2010

CONTRA-CORRENTE



Gosto de andar contra-corrente. Irritam-me as manadas, sobretudo quando as opiniões se juntam por questões de oportunismo e de populismo. Ainda assim – mesmo discordando – respeito a opção diversa. Espero que o mesmo suceda relativamente ao aqui plasmado.

Tem ultimamente gerado muito ruído o tema das remunerações e dos prémios dos gestores. É fácil deixar-se enlevar pelos capciosos argumentos de que em tempo de crise ou comem todos ou não há moralidade. Vai daí e corta-se a eito.

Não existe aqui um fundo ideológico. A demagogia não é de esquerda nem de direita, veja-se aliás donde saem – regra geral – os apelos... Estes são os mesmos que acham que os políticos ganham muito, que os juizes são uns bandalhos, que os professores não fazem puto e que os médicos são os privilegiados do costume. Assusta-me que o país, subitamente, pareça concordar com tudo isto!..

Identifico facilmente alguns erros no que tenho lido e ouvido sobre a polémica dos salários dos gestores:

Primeiro erro: generalizar. Nem todos os gestores são iguais. É perigoso achar que sim. As habilidades e competências variam; os sectores de actividade também e, finalmente, os resultados devem ser levados em linha de conta.

Decidir cegamente cortar com prémios, variáveis e bónus sem ter em consideração a diversidade pode ser um tiro na culatra. No meio da enxurrada vão os bons. Além disso, há casos onde o Estado tem uma palavra a dizer, outros onde nem deve opinar.

Segundo erro: depreciar o mérito. Está provado que os estímulos servem para a obtenção de melhores performances e que dos esquemas de mérito sempre faz parte o prémio. Uniformizar à partida e não distinguir à chegada é pressuposto de um modelo que ruiu há uns anos e cujos resultados não deixam saudades. Recuperar estes modelos em tempo de crise não augura nada de bom!

Terceiro erro: nivelar por baixo. Tratar realidades distintas do mesmo modo é meio caminho para o erro e para o insucesso. Pagar o mesmo a todos independentemente dos resultados é uma não solução, que agradará a medíocres que não ambicionam, não sonham, não suam nem exigem!

Quarto erro: deprezar a mobilidade. Muitos dos gestores que são bem sucedidos em Portugal conseguem sê-lo em qualquer parte do Mundo, por isso mesmo a globalização está a provocar um êxodo de talento nacional. As gerações mais novas não estão para este nível de exposição, que num país tão pequeno tem um preço mais elevado.

Quinto erro: confundir custo com benefício. No meu entender, a distribuição equitativa da riqueza faz-se através da tributação fiscal dos salários, prémios e bonificações dos gestores devolvendo “à sociedade” parte daqueles benefícios permitindo que outros possam deles usufruir. O contrário é mesquinhez e inveja pequenina.

Finalmente, o caso de António Mexia e da EDP, que tanta gente se apressou a comentar e a qualificar, merece uma análise especial por todos os outros. Sendo verdade que sou sensível ao facto de se tratar de uma empresa monopolista e que, por isso mesmo, os méritos de gestão podem ser relativizados (resultados mais fáceis de alcançar, supostamente...), a verdade é que Mexia não se acomodou e saiu da zona natural de conforto: foi em busca de novos mercados (veja-se o sucesso da operação americana), continua a investir muitos milhões em Portugal (por isso a dívida bancária) promovendo o emprego; impôs a EDP como um dos “players” mais importantes do Mundo na área das renováveis e, “last but not the least”, fez da eléctrica portuguesa um caso muito sério de responsabilidade social.

Além disso, o que Mexia está a receber reporta a três anos de exercício e estava previsto “ab initio”. As regras eram conhecidas. Mudá-las quase no fim apesar dos resultados positivos faria do Estado algo que nós não queremos que ele seja: uma pessoa não de bem!

Nada do que fica exposto prejudica os padrões elevados de ética nos negócios e a necessidade de serem adoptadas de forma generalizada regras de corporate governance em Portugal. Nada do que disse afasta a necessidade de em situações excepcionais se poderem tomar medidas especiais, mas avisam-se e preparam-se as vontade de todos não se impõem por decreto aos “79 minutos de jogo”...

Publicado no Diário As Beiras

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