A candidatura de Manuel Alegre à Presidência da República era, há muito, uma inevitabilidade. Diria mais, desde o dia em que alcançou um resultado notável – face a todas as circunstâncias – e na sequência do crescente afastamento de Alegre do Partido Socialista (leia-se Sócrates) que estava “escrito nas estrelas” este desígnio do poeta.
Aliás, a natureza da eleição presidencial é muito clara: a candidatura é pessoal e não partidária. Em rigor, Alegre depende apenas de si mesmo e da respectiva vontade. Os apoios partidários vêm depois. Ou não…
Assim, o que se pode discutir é apenas o momento da apresentação da disponibilidade pública de Alegre para o cargo. Nunca por nunca a legitimidade do gesto.
E, mesmo quanto à oportunidade, devo dizer que Alegre está a ler bem o contexto: Cavaco Silva atingiu os níveis mínimos de popularidade; as relações entre S.Bento e Belém agudizaram-se e não dão mostras de serenar; o estado social e económico do país obrigaria a um papel mais activo do Presidente enquanto força mobilizadora e não substitutiva do governo…Isto é, há evidentes razões para se abrir (a um ano de distância) o dossier presidencial, tanto mais que Alegre precisa de tempo para se dar a conhecer.
Curiosamente (ou não) ao governo e ao PS também interessa esta desfocagem da realidade: enquanto comentadores, analistas, repórteres falarem de Alegre e das presidenciais sobra menos tempo para a crise e para o défice.
Impressiona-me, por isso, a inabilidade dos que (sendo socialistas) criticam Manuel Alegre por estar a trilhar um caminho que, nesta fase, só poderia ser seu. Sobretudo quando dentro do próprio PS não existem alternativas, nem assumidas nem veladas. Mais, ao invés de afastarem Alegre deveriam querer chamá-lo para se ouvir o que pensa do futuro.
Mas, não! Fazem tudo ao contrário…
Manuel Alegre, goste-se ou não, tem um papel na história deste país. Tem uma obra literária invejável. E no seu “adn” a marca Coimbra, pelo que desta cidade deveria partir o seu principal bloco de apoio, podendo com isso recuperar uma relevância política há muito perdida.